Na manhã seguinte seguinte, apesar do céu se aparentar límpido, o dia parecia ainda mais escuro e profundo. Jaden não conseguia parar de pensar no que tinha encontrado naquele beco, e de quem lá tinha visto, em circunstâncias tão improváveis. Todo este vórtice de reflexões pela noite anterior fez com que o seu estômago se fechasse a sete chaves. Ao pequeno-almoço, os seus pais trocaram olhares cúmplices, de quem se mostrava preocupado ou constrangido com certas atitudes. E de facto, Jaden não parecia estar na sua mente sã. Era submergido por pensamentos macabros sempre relacionados com a morte: ou uma criança a ser torturada, ou uma mulher estendida no chão. Todos esses flashes tiravam-lhe todo o ar dos seus pulmões, e enfraqueciam-no de uma maneira que quase nem tinha vontade de falar. A sua cabeça encontrava-se a mil, e os seus olhos fixavam o prato de cereais no qual não tocara desde que se sentara à mesa.
- Jaden, tu estás bem filho? – perguntou o seu pai, afavelmente. Mas Jaden não respondeu; em vez disso continuava a brincar com os seus cereais. - Jaden?
- Uh? Diz…
- Está tudo bem contigo?
- Sim, está – limitou-se a dizer. – Bem, acho que é melhor ir. Tenho um exame logo na primeira hora e não quero chegar tarde.
Na verdade, aquele dia estava livre de exames, mas Jaden apenas queria um pretexto para se conseguir livrar de um interrogatório que parecia estar iminente. Quando chegou à Universidade, avistou Daisy, sentada nas escadas da entrada a ler um livro. Por momentos, a sua mente esvaziou-se, e apenas deu por si a pensar na noite anterior em que tinham ido ao cinema e jantado.
- Daisy!
O seu cérebro continuava a debater-se contra o crânio, latejando arduamente, mas não queria deixar passar a oportunidade de falar com ela.
Daisy virou-se para trás ao ouvir o seu nome, a mão direita firmemente pousada na alça da mala que assentava sobre o seu ombro. Assim que o viu aguardou, ajeitando a fita roxa da cor de um rabanete.
- Daisy… obrigado pela tarde de ontem. Estava mesmo a precisar de descontrair, com esta cena dos exames e tudo isso… - agradeceu Jaden.
- Era só isso que querias? – surpreendeu-se ela, parecendo ligeiramente desapontada.
Jaden fez que sim com a cabeça, ouvindo um grupo de alunos finalistas rirem-se de uma anedota lamentavelmente seca que o mais alto deles se lembrara de contar.
- Eu também gostei muito da tarde… Mas não valia a pena isto tudo só para me agradeceres – comentou Daisy, com um sorriso, apontando com o queixo o local de onde Jaden viera a correr.
Jaden riu-se, enquanto consultava o relógio. De seguida, Daisy foi para a aula de Técnicas Contabilísticas enquanto Jaden se sentava num banco. Pensamentos horrendos voltavam a aflorar no seu íntimo. Morte, morte e mais morte. Nada parecia fazer sentido na sua mente, nem mesmo as coisas mais óbvias. Era evidente que não se sentira bem desde aquela noite. E de súbito, um ruído entrou pelos seus ouvidos, seguido de um baque grave e intenso. Contudo, quando desceu com os pés à terra, viu Thomas ao seu lado, estalando os dedos como forma de reanimação.
- Bem! Vejo que te interrompi os pensamentos! – exclamou, a rir-se genuinamente.
Jaden olhou-o com os olhos semicerrados, mas algo dentro de si o fez responder.
- Não… estava só distraído. Como estás?
- Estou bem – virou a sua cabeça lentamente, como se estivesse com um torcicolo. – E tu?
- Não sei… sinto-me estranho! Como se nem estivesse aqui ao pé de ti! – soltou uma gargalhada que se assemelhou intimamente a uma que Nathan mandava sempre que se ria das suas próprias piadas – Eu hoje não estou bem…
- Deixa lá… todos nós temos os nossos dias menos bons! – a indiferença com que Thomas dissera aquelas palavras levaram Jaden a olhá-lo com um certo ressentimento, mas ao mesmo tempo aliviou-se por não ter mais uma pessoa a olhar para ele como se fosse uma aberração. Sentiu-se, até, satisfeito, pois ao contrário dos seus pais, e de Daisy e Nathan (caso eles lá estivessem), Thomas parecia compreendê-lo, em vez de o examinar com uma expressão anormalmente preocupada. – Então, preparado para o exame?
- Exame? Que exame?
- Ná, estava a brincar contigo! Ah! Agora consegui fazer-te rir! – exclamou Thomas, satisfeito, ao ver um sorriso esboçar-se do rosto de Jaden.
Por breves segundos, sentiu uma paz submergir a sua mente, que o fez olhar em redor. Tudo parecia ter mais cor. Tudo parecia mais vivo, e os pensamentos agourentos que o atormentavam desvaneceram-se numa nuvem de sentimentos de tranquilidade.
- Está calor! – queixou-se Jaden, embora o seu relógio apontasse 7ºC.
Arregaçou as mangas da sua camisola, e Thomas estacou durante instantes. Os seus olhos pareceram perder a cor, e a sua expressão voltou a ficar apática.
- O que é isso que tens no braço? – inquiriu, com uma voz rouca.
Jaden olhou para o braço, e depois respondeu:
- Oh, nada. É apenas uma marca de nascença!
- Posso ver?
- Hum… Ok.
Thomas aproximou-se do braço de Jaden, que este quase que sentia a sua respiração. Os seus olhos mantinham-se arregalados, e a boca entreaberta. Parecia espantado.
- Não te preocupes. A médica disse que não tem mal nenhum. É benigna.
- Se eu fosse a ti não apanhava sol nessa parte!
- Também tu? – indagou Jaden, colérico. – Já basta a minha mãe! E o meu pai, e a Daisy…
- Então talvez devesses dar-lhes ouvidos. Está mais vermelha…! – as últimas palavras pareceram quase inaudíveis, como se estivesse a falar para si próprio e não para Jaden enquanto observava a marca com olhos de míope.
- Thomas…? – perguntou Jaden, quase num chamamento.
- Que foi?
- O que era aquele lugar? Aquele onde eu te vi ontem, e que tinha uma espécie de… sei lá, ‘porta de luz’!
Thomas levantou a cabeça da marca, e olhou Jaden com ferocidade.
- Não voltes àquele sítio! – limitou-se a dizer, levantando-se do banco.
- Não me respondeste à minha pergunta!
- A sério… afasta-te daquele sítio.
- Mas que sítio é aquele?! – insistiu Jaden, com um tom de voz mais altivo, fazendo Thomas virar-se para trás, com uma cara de poucos amigos.
- Volto a repetir: não voltes àquele sítio!
- Caramba! Porque é que não me podes dizer?
E pela primeira vez desde que se lembrava, Thomas denotou uma expressão tão fria e irritada que quase nem parecia a mesma pessoa. Uma veia avultou-se na sua têmpora, e o seu pescoço encheu-se de veias salientes.
- Eu não te digo, porque se o fizesse não acreditarias! Tu pareces um rapaz inteligente, por isso espero que compreendas o que eu vou dizer, caso contrário nem me darei ao trabalho de repetir – aproximou-se de Jaden e sussurrou. – Há certas coisas que vais ter de aprender, descobrir, partilhar e questionar. Mas também há certas curiosidades que vais ter de conseguir controlar. Nem tudo ao cimo desta terra é para tu saberes, Jaden – pela primeira vez, Thomas pronunciou o seu nome com um ênfase que lhe provocou um arrepio pelas costas. – Espero que tenhas percebido. Não voltes a procurar aquele sítio… afinal, é apenas uma sala de um museu…
Estas últimas palavras entraram nos ouvidos de Jaden, e este ficou hirto que nem uma estaca. Seria aquilo uma ameaça? Apenas sabia que, a partir daquele momento, a sua curiosidade desapareceu por completo, e a sua cabeça pareceu andar à roda, como se estivesse prestes a desmaiar.
- Certo…
2 comentários:
OMG OMG OMG! O Thomas parecia tipo, aqueles vilões todos marados e horrorosos, com a voz super calma mas com uma voz toda arrepiante e assustadora! o.o
Está mesmo brutal, a tua escrita está cada vez melhor!
Continua assim, plzz! +.+
Muito fixe!
O Thomas olhou cá de uma forma para a marda de jaden terá alguma coisa a ver com os puderes dele?!
Vou já ler o próximo!
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